INTRODUÇÃO
Para o cristão conservador ou fundamentalista a Bíblia é a Palavra de Deus inspirada pelo Espírito Santo (II Ped.1: 21). É a norma e fonte autoritativa em questões doutrinárias. Por meio dela Deus se revela como o único Deus verdadeiro. A especificidade da religião revelada em relação às religiões pagãs consiste em adorar um único e verdadeiro Deus. Os verdadeiros adoradores, desde a época de Abraão, Isaque e Jacó adoraram um único Deus (Deut 6.4). Eram, portanto monoteístas, enquanto que os povos das nações eram politeístas. Assim, para a fé monoteísta é inconcebível a existência de múltiplos deuses. O próprio Deus revelou isso no coração da lei mosaica: “Não terás outros deuses diante de mim” (Êxodo 20:3). Nesta perspectiva, somente o Deus verdadeiro e único é digno de adoração e nenhum outro deveria ser adorado: nem anjos, nem homens, nem criatura alguma que não seja o “único Deus”.
Porem,
o Novo Testamento (NT) nos revela uma “segunda” pessoa divina distinta do Pai:
o Filho de Deus. Ele recebe adoração e
louvores. Ele é o Logos de Deus que era Deus (João 1.1). Também apresenta o
Espírito Santo como um ser divino, pessoal, intimamente relacionado com o Pai e
o Filho, porem distinto de ambos. Ele é o outro Consolador prometido por Cristo
a seus discípulos. Os dados estão na revelação, porem não nos foi explicado
conceitualmente como pode existir um único Deus e ao mesmo tempo haver três
pessoas divinas. Sabemos que o NT não foi escrito na forma de um manual
doutrinário ou compêndio de teologia sistemática, e assim não encontramos a
doutrina de Deus e das três pessoas divinas conceituada na Bíblia. Essa
ausência de conceituação doutrinária ocorre em relação a outras doutrinas. É
notório que o NT não foi escrito no formato de uma “enciclopédia teológica”, contendo
as crenças da igreja cristã sistematizadas. As verdades doutrinárias estão quais
joias dispersas por toda a Bíblia, e precisam ser reunidas, organizadas,
conceituadas para ter sentido e assim formar um corpo doutrinário coerente.
Como disse Isaias: “Porque é mandamento sobre mandamento, mandamento sobre
mandamento, regra sobre regra, regra e mais regra, um pouco aqui, um pouco
ali.” Isaías 28:10. A tarefa de reunir os dados, organizar e conceituar a doutrina cristã, coube a um período posterior; e cabe a cada um
de nós, averiguar se esta tarefa foi bem feita ou não. Precisamos saber por nós
mesmo se a doutrina cristã é defensável à luz da Bíblia ou se é mera tradição sem
embasamento bíblico.
A
necessidade de explicar a doutrina de Deus surge com toda força no período
pós-apostólico. Principalmente porque o mundo grego-romano estava ouvindo o
evangelho; o evangelho que dizia que um judeu do século I era Deus (João 1.1).
Isso precisava ser conciliado com o conceito de “um único Deus”. Explicar de
forma coerente não foi fácil e surgiram várias tentativas; mas não foram
aceitas por negarem um ou outro aspecto da Revelação. Era preciso uma “fórmula”
que pudesse explicar e harmonizar todos os dados da revelação sem entrar em
contradição. Esta questão alimentou os debates teológicos durante os cinco
primeiros séculos da história da Igreja. A explicação prevalecente foi resumida
numa fórmula conhecida como Trindade. [1]
Em
alguns momentos da História da Igreja grupos heréticos surgiram ensinando
ideias distorcidas e rejeitando a doutrina da Trindade. Atualmente seus herdeiros tem procurado semear
tais ideais qual joio no campo do Senhor. O resultado tem sido cristãos
renegando suas crenças, abandonando suas congregações para se unirem a grupos
antitrinitarianos, e o pior, renegando a verdade revelada. Estas correntes são
conhecidas como: unitarianos, unicistas, arianos e semiarianos. Todos estes
negam a Trindade em algum aspecto; ora suas ideias se assemelham, ora se
diferenciam entre si, havendo variantes mesmo numa mesma corrente.
Este
texto tem como objetivo analisar os principais argumentos antitrinitários, em
especial a corrente semiariana e oferecer uma apologética (uma defesa da fé)
Trinitariana. Entendemos que certo “zelo” misturado à falta de conhecimento tem
sido a causa de tantos serem levados por estes ventos de doutrinas. Às vezes
até se tem algum conhecimento, mas superficial e mal organizado. A apologética
é útil ao fornecer aos cristãos argumentos precisos, organizados e eficientes.
É importante saber defender eficazmente a fé cristã para o nosso benefício
espiritual e para preservação da sã doutrina. Não devemos ser havidos por debates, mas
devemos estar preparados para eles. Veja o que escreveu o apóstolo Pedro: “Antes,
santifiquem Cristo como Senhor no coração. Estejam sempre preparados para
responder a qualquer que lhes pedir a razão da esperança que há em vocês”. 1
Pedro 3.15.
Quando
desafiado a explicar a doutrina da Trindade você consegue fazê-lo com coerência?
Consegue reunir um conjunto de textos bíblicos e fazer uma exposição bem
fundamentada? Quando um unicista, ariano ou semiariano o desafia com argumentos
que negam a Trindade, você consegue respondê-los com um claro “assim diz o
Senhor”? Ou diz que vai consultar um especialista? Creio que não precisamos
fazer uma “cruzada” aos antitrinitarianismo, mas quando chamados a dar
testemunho da nossa fé, ou quando percebermos que pessoas queridas estão
precisando de ajuda, não devemos retroceder.
Que
corrente doutrinária consegue explicar melhor a doutrina de Deus? O
antitrinitarianismo ou o Trinitarianismo?
Uma boa doutrina de Deus deve contemplar “todos” os dados da revelação,
reunindo e formando um todo harmonioso. Deve ser coerente do começo ao fim de sua
exposição. Tem que argumentar de forma clara e em harmonia com a Bíblia, com o
cuidado de não violar as Escrituras. Veja abaixo vários aspectos (entre outros)
em que o semiarianismo violenta as Escrituras:
a)
Destrói
a unidade do Deus único.
b)
Adora
mais de um Deus.
c)
Cai
em politeísmo.
d)
Nega
a plena eternidade do Filho de Deus.
e)
Quebrar
o 1º mandamento da lei de Deus.
f)
Nega
a personalidade do Espírito.
g)
Impede
que Deus habite no salvo.
O
que é uma heresia? É uma mistura ou combinação de ideias verdadeiras com ideias
falsas. Geralmente ocorre quando se enfatiza exageradamente um aspecto da
verdade em detrimento do restante. Por exemplo, a Bíblia diz que a salvação é
pela graça mediante a fé. Mas também diz que a fé sem obras é morta. Podemos
enfatizar tanto a justificação pela fé ao ponto de acharmos que não há
necessidade de obedecer aos mandamentos de Cristo. Ou enfatizar as obras ao
ponto de cair no legalismo. Uma heresia pode ser muito convincente, pois se
baseia em parte da verdade. É necessário ter muito discernimento para não cair
no erro.
Quando
uma heresia é propagada no seio da igreja de Cristo ela quebra a unidade da fé.
Começam as disputas e o espírito de crítica e partidarismos toma conta dos
irmãos, que antes viviam harmoniosos. Nem sempre é possível ter todos os
crentes unidos em todos os aspectos doutrinários. Isso não deveria incomodar a
liderança da igreja. Toda igreja tem seu corpo de doutrinas básicas. Creio que
não há problema que tenhamos ideias particulares sobre determinado assunto,
desde que não divirja das crenças cristãs fundamentais e que não se faça
proselitismo das mesmas. Se suas opiniões são significativamente divergente das
defendidas pela igreja na qual congrega e não consegue guarda-la para si, creio
que deveria ser honesto e procurar outra congregação com a qual possa se
identificar. Ficar na igreja discordando e criticando de tudo e de todos, a fim
de receber a merecida exclusão do rol de membros e alegar que foi perseguido por causa do
evangelho, no mínimo de parece artimanha diabólica.
Nesta
obra não faremos uma apresentação sistemática da doutrina da Trindade[2]. Nosso
método consistirá em analisar os principais argumentos semiarianos à luz da
verdade bíblica, demostraremos como o semiarianismo é autocontraditório e
incompatível com a Bíblia. Assim, oportunizaremos aos cristãos trinitários o
aprofundamento de seus conhecimentos, e aos semiarianos uma auto reflexão.
A doutrina de Deus não é assunto fácil. Mas
sem dúvida é de suma importante. Às vezes, poderá ocorrer que precise reler certos
trechos deste livro, para captar melhor as ideias aqui tratadas. Leia todos os
textos citados, em sua própria Bíblia quantas vezes for necessária. Ore a Deus
e peça seu Espírito Santo para te conceder sabedoria e discernimento. Um
assunto difícil merece atenção e oração especial. No dia final, todos
individualmente teremos de comparecer diante do tribunal de Cristo.
[2] Para este fim,
ler: WHIDDEN, Woodrow; MOON, Jerry;
REEVE, John W. A Trindade: como
entender os mistérios da pessoa de Deus na Bíblia e na história do
cristianismo. 2. Ed. São Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 2006.